Por Patricia Jacob*
A amizade é um tema bastante complexo, então vamos começar a explorá-lo hoje, conhecendo como funciona essa relação nas diferentes idades das crianças, o que é comum ou não nas diversas fases. Até 1 ano de idade mais ou menos, outras crianças são mais objetos de curiosidade do que outra coisa. Ainda não há relação de amizade. Se estão juntos, os bebês se observam, se tocam, se “pesquisam” como fazem com os brinquedinhos (querem apertar, sentir que gosto tem, …).
De 1 ano e meio a quatro anos e meio aproximadamente, a criança passa por uma fase de egocentrismo: só consegue ver o mundo através de seu ponto de vista e ainda não consegue compreender e se importar com os sentimentos e as necessidades dos outros. Parece até um egoísmo, mas que é natural da idade, pois eles ainda não têm maturidade para agir diferente. Ou seja, nessa fase, apresentam comportamentos opostos do que exige uma amizade. Até 3 anos elas vivem esse egocentrismo com muita intensidade, e isso vai ficando mais ameno depois disso, possibilitando à partir daí o início de relações de troca. Se você observar um grupo de crianças na pré-escola, vai perceber que elas quase não brincam juntas, apenas estão próximas, cada uma se preocupando com sua própria atividade (ou se preocupando em pegar o brinquedinho do outro!). Então, se você ver seu filho de 2 ou 3 anos arrancando impiedosamente um brinquedo da mão do “amiguinho” e não se sensibilizando nem um pouco com o choro sentido dele, não se desespere achando que está criando um monstrinho egoísta! Lembre-se: nessa idade isso é absolutamente normal. O que devemos fazer é “protegê-los” uns dos outros e ir aos poucos lhes ensinando a compartilhar. Mas sempre lembrando que só estarão aptos a entender melhor o que é isso após os 3 anos, e que é só com 4 ou 5 anos que eles realmente estão prontos para exercitarem o conceito de amizade como nós adultos o entendemos.
Mas tente perguntar para uma criança de 6 anos quem são seus melhores amigos: ela irá nomear cada um de sua turminha de escola. O melhor amigo mesmo, aquele com quem a criança aprende a lealdade, o companheirismo e troca mais afeto, aparece por volta dos 7 ou 8 anos. A partir dos 9, tornam-se realmente confidentes, mas notamos que os meninos têm uma relação mais estável que as meninas. Estas são críticas, cobradoras, possessivas. Nesta idade, ainda imperam as panelinhas do mesmo sexo. Só com a entrada na adolescência é que aparecem as amizades com o sexo oposto. E aparecem também “tipos” diferentes de amigos: o amigo das horas difíceis, o amigo de todas as horas, o amigo de farra, o da escola, o da rua…
Agora vamos falar um pouco de como ajudar seu filho a criar relações de amizade saudáveis e positivas?
Em primeiro lugar, vamos esclarecer um ponto muito importante: é muito melhor uma criança ou um adolescente que não é muito popular, mas tem um ou dois grandes amigos, do que aquele “famosão” que conhece a cidade inteira, se enturma com facilidade em qualquer lugar, mas que não tem nenhum “melhor amigo”. Esse segundo pode correr o risco de estar sempre rodeado de gente, mas se sentir extremamente solitário quando precisar de alguém realmente especial, com quem ele possa contar. Então é desse amigo que estaremos falando, ok?
É esse tipo de amizade que anda faltando hoje em dia na vida da molecada, e que está precisando ser incentivada pelos pais. Mas ao contrário, o que é que mais vemos acontecer? Pais que desestimulam vínculos fortes por parte dos filhos, que dizem: “Só ele??? Você precisa ter mais amigos, moleque!” ou “Larga de ser boba, menina! Fica se apegando muito e daqui a pouco ela arruma outra amiga e te deixa de lado!”. Fazem isso provavelmente por que já sofreram muita decepção e não querem que os filhos também sofram. Então os ensinam que é melhor nem se apegar para não sofrer. Só que não percebem que com isso estão privando seus filhos de coisas importantíssimas na vida. Com os amigos, as crianças estão exercitando relacionamentos futuros, aprendendo a viver em sociedade, aprendendo conceitos básicos de convivência, e mais importante, estão aprendendo a exercer sua afetividade e conhecendo o que é apoio, respeito, compreensão, troca afetiva… Correm o risco de se magoarem, sim, mas assim é a vida! Sem isso, tornam-se seres vazios, ocos…
Então, pais, deixem que eles se apeguem, se alegrem, se machuquem, sofram… deixem que eles vivam!
Continuamos nesse tema no artigo “Parceria X Amizade”.
Um abraço!
*Patricia Jacob é psicóloga clínica formada pela USP-SP.